9 de agosto de 2012

Festa anticonformista



Por Juliana Monachesi

Ambigüidade é o nome do jogo aqui. O artista Éder Roolt carrega nas tintas para pôr em xeque noções culturais de real e realismo, de reprodução e identidade, de padrão e desvio. Bebendo na fonte do hiper-realismo, do qual ao mesmo tempo desconfia profundamente, Roolt cria uma linguagem própria de pintura figurativa – que passa então a distorcer e tencionar conforme a necessidade do tema abordado ou da iconografia eleita.

De instantâneos de uma infância inocentemente despudorada a uma adulteração da candura, passando por indícios do inconsciente -o brinquedo, a memória indireta da fotografia, o símbolo do fim de festa-, as pinturas do artista escancaram as maiores perdas do mundo real. A infância, na obra de Roolt, não é um tema localizado, mas antes um recurso metafórico para retratar a subjetividade contemporânea na era da infantilização geral e indiscriminada da maturidade, e também o seu reverso, a precocidade e queima de etapas psicológicas e culturais no universo infantil.

Além disso, a infância funciona, em suas pinturas, como pretexto reconhecível para evidenciar o trânsito entre ficções documentadas e documentos obliterados no imaginário cultural contemporâneo, propondo assim respostas a perguntas como Qual a atualidade e relevância da pintura hiper-realista em tempos de disseminação dos meios de registro e reprodução da fotografia e do vídeo? Faz sentido ainda opor pintura a fotografia nos dias de hoje?

A pintura paulistana vive um boom como não se via desde os anos 1980. Porém, como 30 anos atrás, diante da avassaladora quantidade de obras produzidas pelos pintores, é imenso o desafio de diferenciar o bom do mediano, e mais difícil ainda é distinguir o bom do ótimo. Quais destes pintores que despontaram no final da década de 2000 vão ficar? Que artistas da geração 2010 têm condições de continuar produzindo um trabalho relevante daqui a dez ou 20 anos?

A exposição de Éder RoolT ajuda a separar o joio do trigo no contexto da pintura de seu tempo. Pelo contraste que propiciam em relação a boa parte da produção vigente, suas telas evidenciam o quão complacente e apaziguadora é a pintura praticada nos ateliês paulistanos hoje em dia (porque não se compromete com nada, tem medo de fazer escolhas ou defender o que quer que seja, e acaba esvaziada pela banalidade). Sua pintura, ao contrário, é crítica. Seu discurso é sofisticado. Sua técnica, impecável. E está em boa companhia: Marilyn Minter, Montean & Rosenblum, Eric Fischl, Rudolf Stingel e Dan Colen são alguns dos artistas com quem sua obra dialoga.

Estes são artistas que deixaram no passado o embate entre figuração e fotografia, assim como entre realismo e romantismo, e conferiram, deste modo, outra razão de ser para a pintura de base fotográfica. Um tipo de pintura, aliás, que requer outra designação. "Hiper-realismo", está claro, não dá mais conta de descrevê-la. Cumpre, diante das telas apresentadas em Festa Anticonformista, perguntar que tipo -ou qual camada- de realidade está em questão, ou mesmo qual o assunto delas, por que são apresentadas nesta e não em outra seqüência, e por que estão reunidas sob este título.

Está tudo aí. Basta olhar com atenção.

 
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